Por Renata Barcelos
Se não tem tempo para reflexão e planejamento, não é gestão. Essa é uma das frases que sempre repito, pois é um dos problemas que mais encontro nas empresas: ‘pseudoplanos’ que colocam o sucesso da estratégia do negócio em risco.
Foi a demissão de um gestor por causa de um problema que poderia ter sido evitado com um mínimo de planejamento que me motivou a escrever esse artigo (sim, ele tinha um ótimo currículo como gerente, mas não sabia planejar). Mesmo depois de 3 meses de sua contratação, quando ele chegava a reunião com a diretoria, simplesmente não sabia explicar como pretendia organizar seu novo time, ou sequer, o que estava analisando para tomar essa decisão. Seus diretores se sentiam refens e obrigados a confiar em um discurso que, simplesmente, repetia as diretrizes que eles mesmos haviam dado.
A postura de resistência desse profissional acabou afastando-o da empresa, mas deixou claro como eu poderia contribuir explicitando o que deveria ser básico para qualquer gestor: quem não tem tempo para pensar e planejar, não está fazendo gestão. Em qualquer nível. Simples assim.
Partindo da agenda de planejamento estratégico, uma empresa deve definir a visão de futuro, propósito, objetivos e iniciativas gerais na busca do sucesso.
Mas é no planejamento tático que a estratégia se aproxima, de fato, da execução. Um plano tático é uma ponte de materialização entre estratégia e comportamento organizacional (processos e pessoas). Isso significa que ele traduz a estratégia em ação clareando os desafios que serão encarados diante de uma análise mais precisa e detalhada do que aquela feita na ocasião da reflexão estratégica.
Afinal, o contexto (interno e externo) tende a ser complexo e dinâmico na maior parte das empresas e, na medida em que o tempo passa e que a empresa entra em contato com a realidade daquilo que eram apenas ideias e premissas, novas percepções podem se revelar. Além disso, ao se mergulhar em um problema de forma reflexiva é que se percebe, de fato, o tamanho que ele tem.
O exercício do planejamento tático permite que os gestores compreendam o esforço que a estratégia exige na vida real. Portanto, ele é uma condição para que eles possam orientar o destino dos recursos, desenvolver suas equipes, calcular riscos e aprender antes de falhar no mundo real e de forma desnecessária.
Por exemplo, um dos erros mais comuns dentro das organizações está na falta de sincronismo entre áreas. Comunicação indevida está na origem dessa falha, mas como se pode comunicar aquilo que não foi sequer entendido? O planejamento é, primeiramente, um exercício de compreensão que permite aprendizado e compartilhamento e, quando bem feito, promove o alinhamento de todo o time de execução.
Mas, como conduzir esse processo da melhor forma? Cito abaixo 6 pontos que considero mais relevantes e que não vejo sendo tratados na literatura gerencial com a ênfase necessária:
1 — apresente a estratégia e a motivação do plano com clareza: aqui, eu peço desculpas aos mais experientes por terem que ler algo tão obvio, mas, na prática, há empresas que, simplesmente, descumprem essa etapa. Para iniciar seu planejamento, os gestores precisam entender quais são as maiores expectativas, foco da liderança e condições gerais para que a estratégia seja cumprida. Todo plano tem uma meta orientadora e ela deve deixar claro o porquê da dedicação à reflexão estruturada;
2 — busque aderência estrutural e cultural: se o tripé estratégia-estrutura-cultura não for tratado no próprio nível estratégico, obstáculos fundamentais podem não ser identificados e poderão minar qualquer esforço no nível tático. A velha frase de que “a estrutura come a estratégia no jantar e a cultura a devora o que resta no café da manhã” gera consequências todos os dias e precisa ser endereçada. Nas minhas aulas de execução estratégica para executivos, curiosamente, ao testar com os alunos boas práticas existentes em suas empresas, sempre surgem diversos exemplos no âmbito da cultura, mas raramente surgem respostas sobre ações na estrutura organizacional. Será que as empresas entendem claramente como a estrutura pode potencializar ou travar uma estratégia?
3 — defina metas claras: não conheço nada mais preciso para se testar a compreensão da estratégia do que a sua tradução em métricas. Não estou falando de perfeição, afinal, nem tudo pode ou vale a pena ser medido. Estou falando de um exercício sistêmico e organizado de combinação de objetivos com o mínimo de ambiguidade. O desdobramento de metas é uma etapa posterior ao planejamento estratégico e deve envolver toda a gestão. Metas não devem ser propostas como sinônimo de cobrança, mas sim, como tradução do desafio a ser encarado. (A forma como essas metas serão gerenciadas - KPI tradicionais ou OKR – é assunto de vários outros artigos que publiquei anteriormente e por isso não será explorada aqui.)
4 — foque em equipes antes de áreas ou indivíduos: quanto maior o desafio, maior a necessidade do envolvimento de diversas competências para realizá-lo. É ideal que as pessoas tenham metas individuais, sim, mas, mais importante do que isso, é que times fortes sejam organizados em torno de objetivos comuns. As consultorias do passado tendiam a desdobrar metas para cada área e indivíduo muito rapidamente, como se a empresa fosse um simples conjunto de engrenagens. Acho que já entendemos, pela visão sistêmica, que empresas não são máquinas, certo?! No dinamismo escancarado de hoje, são times adaptáveis e orientados que geram mais valor para o negócio;
5 — valide os planos: quando gestores concluem um plano tático, o modelo mental do time que o construiu está claro. Fica explícita a forma como eles refletem sobre o sucesso, como isso impactará no orçamento (que é outro tipo de plano tático, inclusive), dentre outras reflexões. Quando a liderança checa essa percepção por meio do plano, pode trazer novas ideias e percepções de mudanças que precisam ser consideradas antes do início da execução. Não é sobre fazer microgestão, mas sim, sobre perceber o grau de maturidade do time que assumiu o desafio e perceber quando se deve apoiar.
6 — monitore a execução e aprenda: ainda que o planejamento seja realizado com pessoas que participam do dia a dia e que possuem clareza dos desafios no curto prazo, a execução nunca será perfeita diante de outros desafios que surgem ao longo da trajetória. Além disso, na execução, elementos ainda não descobertos se desvelam e podem requerer até a revisão do plano. Cada discussão de acompanhamento deve ser, também, uma discussão de aprendizado e retroalimentação.
Eu reconheço que cumprir essa lógica para o planejamento tático não é tão simples quanto parece. Geralmente, as empresas são melhores em fazê-la por meio do orçamento, mas isso as deixa refens de comportamentos organizacionais que só serão descobertos quando os números sentirem os impactos. E aí, já pode ser difícil demais para promover mudanças e evitar maiores problemas.
Além disso, sem planos táticos claros, as discussões tendem a ficar operacionais demais e a estratégia acaba se perdendo nos ruídos e incêndios do dia a dia. E é essa mesma rotina que faz com que gestores tenham resistência a investir tempo na reflexão estruturada.
Na tentativa de simplificar essa ideia, acabei criando o framework RADAC para traduzir todos os ganhos que temos ao planejar. Como se poderá perceber, os 5 elementos se complementam, mas ajudam muito quando questionados separadamente:
- Reflexão: o dia a dia faz com que gestores se comportem como bombeiros (apagando incêndios) e não façam seu papel real de refletir sobre a realidade de forma crítica e cuidadosa. A reflexão individual e conjunta são ganhos fundamentais do ato de planejar;
- Aprendizado: é melhor errar ou descobrir questões relevantes ao problema na fase de planejamento do que na fase de execução. O ato de planejar, para um gestor, é equivalente ao ato de treinar para um atleta: é a forma de aprendizado mais segura.
- Decisão: intuição é um elemento importante na gestão, mas não pode ser o principal. A reflexão orientada por fatos e dados permite uma decisão com maior qualidade, ainda que não seja garantia de sucesso (sim, o fator sorte sempre vai existir diante de um contexto sobre o qual não temos controle total)
- Ajuste: um plano é uma referência. E contém um mecanismo causal implícito para a geração dos resultados. Ao planejar, entende-se as expectativas e se pode corrigir rotas no ato da execução. Com um plano prévio pronto, o ajuste em um novo planejamento fica muito mais fácil.
- Comunicação: como planejar força os envolvidos a conversarem de forma organizada e, até, a desenvolverem algum material formal (conhecimento explícito), facilita muito o complexo ato comunicativo.

Espero que esse artigo e o modelo acima ajudem gestores a entenderem a célebre frase de Eisenhower “Planos não são nada; planejamento é tudo”. Sair dos antigos hábitos do “fazejamento” requer disciplina e intenção. Entender a importância desse esforço é o primeiro passo.
by Renata Barcelos
Board Member | Startup Advisor | Speaker | Associate Professor | Consultant | Ambidexterity on strategy, culture, organizational structure and people | PhD in Management
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